Não nos cabe a nós perdoar ou não perdoar. Fazer esse julgamento é partir de um equívoco, o acto de perdoar pressupõe um julgamento, na existência em sociedade, é à justiça que cabe julgar, ao espírito, o julgamento não se põe dessa forma…
eu perdoava e sou ateu. não é preciso ser católico para perdoar. o perdão é um mecanismo que nos permite recuperar o equilíbrio perdido e alcançar a paz de forma relativamente rápida e indolor. mas há que reconhecer que os católicos são, entre outras coisas, grandes engenheiros e por isso percebem bem como funcionam certas questões.
mas se o homem (o assassino, que eu perdoei) estivesse encurralado com, deixa cá ver… olha, pode ser com o zico (aquele cão famoso…), num prédio em chamas, e se eu tivesse hipótese de salvar apenas um… era o dia de sorte do zico.
sou um ser humano horrível. um mentiroso. na verdade não perdoei. enfim, é a vida! se um dia me candidatar a um cargo público, não vote em mim!
Nada contra o perdão a este nível. Sendo um puro acto de liberdade individual não é passível de ser intervencionado por um outro senão na medida em que o que perdoa faz sua essa intervenção – quer isto dizer que por muito que alguém possa ser contra um perdão no plano individual nada pode ser feito contra até porque ao limite se a pressão for grande o indivíduo poderá declarar que afinal já não perdoa só para o não chatearem quando afinal pode simplesmente continuar a perdoar em segredo – tal como o inverso, pode dizer que perdoa sem realmente perdoar e passar por quem perdoa quando, em sua disposição puramente interior, continua a alimentar sentimentos de ódio e vingança. Ao limite pode mesmo traçar um plano de eliminação do ofensor que, não sendo descoberto, pode permitir manter a percepção pública de perdão quando em privado já se vingou.
Assim sendo podemos ver a coisa de outro ângulo e perceber talvez a inversão dialéctica do perdão, ou seja, se se perdoa o assassino de alguém porque não se perdoa também o assassino desse assassino, e o assassino do assassino desse assassino e por aí fora. Ou seja, o perdão, mesmo sem querer, e isto é a inversão dialéctica, pode tornar-se no suporte de liberação de uma máquina infinita de vingança, ou seja, que produz e é produzida pela vingança.
Isto, no entanto, é menos o impasse do perdão do que o impasse da particularidade, da individualidade particular ou é o impasse do perdão no plano da particularidade individual quando o seu alcance visa a comunidade ou efeitos políticos.
Este vídeo incomoda-me, porque me parece artificial: “pode alguém ser quem não é?”
Resumidamente: o assassino entra na igreja para deixar uma coroa de flores junto aos caixões daqueles que matou (hipocrisia, ou arrependimento?) e a miúda que assistiu ao brutal assassínio dos pais resolve perdoar e oferecer um abraço ao assassino porque “talvez tenha levado muita pancada em criança” e “Deus não quer que matemos, porque todos somos seus filhos”.
Que ela não o mate, ou aos seus filhos, ainda entendo. Mas de onde vêm este perdão e este abraço?
O perdão é a resposta a um profundo arrependimento, ou um acto unilateral?
Qual é a ideia de fazer um filme destes? Parece-me que transforma o “ama o teu próximo como a ti próprio” num “ama o teu próximo e desama-te a ti próprio” – o catolicismo como apelo à abnegação, à negação de si próprio; o bom cristão como alguém que sublima a “fome e sede de Justiça”, transformando-as neste perdão automático para todas as pessoas e todos os crimes.
Isto é um caminho de salvação, ou uma alienação?
***
Voltando ao terreno da realidade: será que este assassino se vai deixar converter pelo gesto da órfã, ou vai agarrar nela e metê-la no bordel da esquina?
Como responder a este convite ao amor infinito dos filhos de Deus com gestos de obreiros da Paz, e não de lorpas conformados?
Tudo é possível, mas não com uma menina daquela idade e muito menos com aquela justificação. São maus atores, erro de casting, um mau guião, uma coisa grotesca.
Não nos cabe a nós perdoar ou não perdoar. Fazer esse julgamento é partir de um equívoco, o acto de perdoar pressupõe um julgamento, na existência em sociedade, é à justiça que cabe julgar, ao espírito, o julgamento não se põe dessa forma…
não percebi nada.
Coimbra anos 50
‘porrada neles’ e ‘força na verga’
eu perdoava e sou ateu. não é preciso ser católico para perdoar. o perdão é um mecanismo que nos permite recuperar o equilíbrio perdido e alcançar a paz de forma relativamente rápida e indolor. mas há que reconhecer que os católicos são, entre outras coisas, grandes engenheiros e por isso percebem bem como funcionam certas questões.
mas se o homem (o assassino, que eu perdoei) estivesse encurralado com, deixa cá ver… olha, pode ser com o zico (aquele cão famoso…), num prédio em chamas, e se eu tivesse hipótese de salvar apenas um… era o dia de sorte do zico.
sou um ser humano horrível. um mentiroso. na verdade não perdoei. enfim, é a vida! se um dia me candidatar a um cargo público, não vote em mim!
Nada contra o perdão a este nível. Sendo um puro acto de liberdade individual não é passível de ser intervencionado por um outro senão na medida em que o que perdoa faz sua essa intervenção – quer isto dizer que por muito que alguém possa ser contra um perdão no plano individual nada pode ser feito contra até porque ao limite se a pressão for grande o indivíduo poderá declarar que afinal já não perdoa só para o não chatearem quando afinal pode simplesmente continuar a perdoar em segredo – tal como o inverso, pode dizer que perdoa sem realmente perdoar e passar por quem perdoa quando, em sua disposição puramente interior, continua a alimentar sentimentos de ódio e vingança. Ao limite pode mesmo traçar um plano de eliminação do ofensor que, não sendo descoberto, pode permitir manter a percepção pública de perdão quando em privado já se vingou.
Assim sendo podemos ver a coisa de outro ângulo e perceber talvez a inversão dialéctica do perdão, ou seja, se se perdoa o assassino de alguém porque não se perdoa também o assassino desse assassino, e o assassino do assassino desse assassino e por aí fora. Ou seja, o perdão, mesmo sem querer, e isto é a inversão dialéctica, pode tornar-se no suporte de liberação de uma máquina infinita de vingança, ou seja, que produz e é produzida pela vingança.
Isto, no entanto, é menos o impasse do perdão do que o impasse da particularidade, da individualidade particular ou é o impasse do perdão no plano da particularidade individual quando o seu alcance visa a comunidade ou efeitos políticos.
Copio para aqui um post que fiz a propósito (http://conversa2.blogspot.de/2013/02/pode-alguem-ser-quem-nao-e.html):
Este vídeo incomoda-me, porque me parece artificial: “pode alguém ser quem não é?”
Resumidamente: o assassino entra na igreja para deixar uma coroa de flores junto aos caixões daqueles que matou (hipocrisia, ou arrependimento?) e a miúda que assistiu ao brutal assassínio dos pais resolve perdoar e oferecer um abraço ao assassino porque “talvez tenha levado muita pancada em criança” e “Deus não quer que matemos, porque todos somos seus filhos”.
Que ela não o mate, ou aos seus filhos, ainda entendo. Mas de onde vêm este perdão e este abraço?
O perdão é a resposta a um profundo arrependimento, ou um acto unilateral?
Qual é a ideia de fazer um filme destes? Parece-me que transforma o “ama o teu próximo como a ti próprio” num “ama o teu próximo e desama-te a ti próprio” – o catolicismo como apelo à abnegação, à negação de si próprio; o bom cristão como alguém que sublima a “fome e sede de Justiça”, transformando-as neste perdão automático para todas as pessoas e todos os crimes.
Isto é um caminho de salvação, ou uma alienação?
***
Voltando ao terreno da realidade: será que este assassino se vai deixar converter pelo gesto da órfã, ou vai agarrar nela e metê-la no bordel da esquina?
Como responder a este convite ao amor infinito dos filhos de Deus com gestos de obreiros da Paz, e não de lorpas conformados?
Boas perfguntas. vou continuar o debate, com uma pequena variação.
Tudo é possível, mas não com uma menina daquela idade e muito menos com aquela justificação. São maus atores, erro de casting, um mau guião, uma coisa grotesca.